Nesta minha postagem irei falar de um álbum musical, o The darkest skies are the brightest da Anneke van Giersbergen.
8 minuto(s) de leitura.Sobre a artista
Apresento-lhes, para quem não conhece, Anneke van Giersbergen. Nascida em 8 de março de 1973 na cidade de Sint-Michielsgestel, nos Países Baixos, a artista ganhou destaque no final da década de 1990 como vocalista da banda de rock progressivo/alternativo, The Gathering. Logo que foi convidada a se juntar à banda, Anneke acabou por ocupar o posto de principal letrista. Foi através dela que a banda realmente cresceu e se tornou conhecida na cena progressiva mundial.
Em 2007 ela deixa o The Gathering para se lançar numa carreira solo intitulada Agua de Annique. No segundo álbum adota Anneke van Giersbergen & Agua de Annique. Mais recentemente excluiu o Agua de Annique, assinando apenas com o próprio nome. Em sua carreira solo, Anneke percorreu uma linha um pouco diferente, começou com um disco melancólico e intimista, passou por um acústico, pisou no pop rock, voltou ao progressivo com pegadas eletrônicas e por fim outro acústico e intimista.
Inspiração e produção
O último álbum citado anteriormente, o da pegada acústica e intimista, o motivo desta postagem estar sendo escrita, veio depois de um período turbulento na vida da artista.
Em 2016 ela resolveu voltar ao gênero que a consagrou e que tanto gosta, o rock/metal progressivo. Fundou então a VUUR, banda formada por integrantes de outras bandas de metal. Em 2017 lançaram o primeiro disco (In This Moment We Are Free – Cities), que teve uma recepção mista, mas puxando mais para favorável que não favorável. Para a produção do disco e da turnê, Anneke gastou quase todas as finanças que tinha. Após o término, ela concluiu que apostar mais uma vez no VUUR significaria ter riscos financeiros enormes.
Somado a isso, em 2018 temos um outro fato, mais marcante que o anterior, o fim do casamento entre ela e Rob Snijders, empresário e músico. Ele inclusive é o baterista da Anneke desde 2007 em sua carreira solo.
Estes dois fatores, principalmente o divórcio, serviram de inspiração para que a artista mergulhasse no fundo de sua alma e conseguisse expressar todos seus sentimentos na forma de músicas para o novo álbum. Sabendo que precisava escrever e consertar sua vida, pegou um violão e alguns instrumentos simples de gravação e se refugiou numa pequena casa na floresta aos arredores de Eindhoven. Em 2020, com bastante material em mãos, decidiu reunir tudo e fazer um álbum completo. Pediu ajuda de Gijs Coolen (que trabalha com ela desde 2013) para a escolha das músicas e para dar o polimento final nas escolhidas. Foram adicionados instrumentos de corda, trompas e percussão que serviram como enfeites em torno da voz e do violão da holandesa. Em 16 de novembro de 2020 foi feito o anúncio oficial junto da capa do disco e o nome das faixas.
Em entrevista ao Loudersound, Anneke declarou:
“Quando rabisquei algumas ideias para as letras em 2018, dei os primeiros passos na longa estrada que levaria ao lançamento de ‘The darkest skies are the brightest’. É fácil se perder em um mar de dúvidas quando você está escrevendo e gravando músicas altamente pessoais, mas assim que o álbum foi feito, eu consegui deixar a minha mente à vontade. Estou muito orgulhosa do que criamos e o dia do lançamento finalmente chegou”.
The darkest skies are the brightest
O título do álbum (“Os céus mais escuros são os mais brilhantes”, em tradução livre) reflete seu tema principal e refere-se à ideia de que sempre tiramos coisas positivas de situações difíceis, e quanto mais complicadas forem estas situações, mais coisas positivas teremos depois.
Musicalmente, a simplicidade dos instrumentos acústicos aliados à calma e à leveza da voz da Anneke é algo que me agrada muito. Como sempre, sua voz soa de uma forma tão bela, apaixonante e honesta que dá para sentir no seu trabalho tudo o que ela realmente queria expressar. É claramente o trabalho mais pessoal e confidente de sua carreira. O resultado é um álbum maduro e sofiticado.
Ele abre com Agape, uma música serena que inicia apenas com a voz e o violão de Anneke, mas que no decorrer temos o acréscimo de outros instrumentos que vão ganhando corpo, com destaque para os belos violinos. Agape é uma das três expressões gregas para amor. Temos o eros para designar um amor sensual e romântico, uma atração saudável que uma pessoa sente pela outra; temos o philos, que é o amor da amizade, do companheirismo, da lealdade à família; e temos o agape, que é algo maior que tudo, um amor “total”, aquele amor que simplesmente transborda de nós, pela vida, pelos outros, por tudo, um amor genuíno por todas as coisas na Terra e que envolve elementos de eros e philos na procura por uma perfeição, um amor sem reciprocidade, simplesmente amar por amar. Em seguida temos Hurricane, que conta com uma pegada mais sombria e uma batida mais pesada, poderia dizer até mesmo mais “tribal”, mas que, mesmo assim se mostra tão acessível quanto a primeira faixa. A terceira é My promise que consegue ser bastante emotiva, um dos destaques da obra. Os instrumentos, que possuem uma acústica cigana-árabe, gradualmente se desenvolvem para um final eufórico, são um grande contraponto ao vocal de Anneke e tudo parece casar perfeitamente. A letra fala sobre o que acontece após o divórcio e a determinação de lutar por um amor. Lindíssima.
Em I saw a car temos novamente uma batida forte, com ênfase nos instrumentos de percussão. O refrão consegue ser leve e dançante e quebra o clima mais pesado que estava se formando anteriormente. Em The soul knows temos uma ótima música soft rock, bastante agradável aos ouvidos e, assim como a predecessora, bem dançante. Me lembrou bastante alguns trabalhos da Fiona Apple. Além do ritmo, possui uma bela letra. Soa quase angelical. Em The end, voltamos para uma melodia serena e uma letra triste, mas ao mesmo muito bonita e que fala abertamente sobre seu divórcio e o caminho que cada um teve que tomar. Destaque novamente para os violinos que vão ganhando espaço na música. Em Keep it simple, temos uma pegada levemente progressiva (o que chega a ser contraditório).
Lo and behold fala sobre compromissos e do amor deles dois e do filho. Outra música na qual os instrumentos de percussão se destacam. O trabalho vocal de Anneke é dobrado para contemplar vários tons e conta com um dos melhores refrões do álbum. Uma das minhas preferidas. Losing you, como o nome sugere, fala da perda de alguém, talvez contendo uma das letras mais íntimas do trabalho. Em Survive, voltamos para uma batida forte e pesada, bastante dançante. Vibrante é a sensação que eu tenho. A letra, apesar de falar em problemas, nos mostra que sempre há uma saída e que devemos lutar por ela. É uma música poderosa que me faz sorrir e ter vontade de dançar cada vez que ouço. Para finalizar, temos Love you like I love you, uma lindíssima música de amor, motivacional, que lembra que amar alguém é algo realmente lindo. A parte instrumental casa perfeitamente com a voz de Anneke e com a letra, fazendo dela talvez a música mais sentimental do álbum.
Musicalmente, The Darkest Skies are the Brightest consegue ser um trabalho bastante eclético que percorre caminhos calmos e energéticos, sombrios e claros. É um álbum que soa poderoso, íntimo e motivacional. Nota-se claramente que ela pôs todos seus sentimentos nas letras e melodias e muitas pessoas irão se identificar por estarem passando por momentos semelhantes. A arte visual é outro ponto alto. As fotos do fotógrafo Mark Uyl e toda a direção de arte são muito bonitas. Anneke resolveu usar um coração quebrado e remendado como o símbolo do álbum. Ele parte do conceito japonês do kintsugi, que é a arte de juntar as peças de um objeto quebrado usando materiais preciosos, agregando asssim valor e uma individualidade que não existiam na peça original. Enfim, é uma produção que serve muito bem para apreciarmos os momentos lindos da vida quando compartilhados com a(s) pessoa(s) que amamos.
Para finalizar com uma boa notícia, em vez de desistir do casamento, ela e o marido usaram o tempo no qual estavam separados para rever muito de seus problemas de modo a consertar o vínculo e no final reataram a união. O conceito do kintsugi serviu perfeitamente.
Lançamento: 26 de fevereiro de 2021
Gênero: rock / pop / folk
Gravadora: Inside Out Music
Produtor: Gijs Coolen
Duração: 41m51
Faixas:
- Agape
- Hurricane
- My promise
- I saw a car
- The soul knows
- The end
- Keep it simple
- Lo and behold
- Losing you
- Survive
- Love you like I love you
Todas as músicas foram escritas e compostas por Anneke van Giersbergen.
Ouça o álbum completo no: